Como se desmarcara alguém?

 Temos uma predisposição em pensar que as pessoas se denunciam nos seus deslizes. Vemos muita razão em entender que os atos injustos, corruptos e interesseiros desmascaram o individuo mostrando quem de veras é. Venenamos comentários como “tá vendo, olha só o verdadeiro dele se mostrando!” ou “que ato-falho hem!”. Aceitamos como a versão real do outro, aquilo que nos vem à tona em seus momentos de maior despudor, engano ou erro.
  Levanto agora outra teoria minha.
  Pensar em si, ter os reflexos egoístas ou mesmo a feia necessidade de se auto afirmar em detrimento do outro, é –ousado o que vou dizer- característica integrante da natureza do homem desde as cavernas. Faz parte do caráter de um homem primitivo que teve de sobreviver, se alimentar e competir para copular com uma fêmea fértil para perpetuar os seus. Começou assim! Parece estranho dizer mas é como se essas fossem macas de nossa condição inicial mais prima.
  O desenvolvimento do comportamento e a evolução das relações interpessoais são o que fazem o homem pós-moderno entender que, à despeito da concorrência que ainda É, existem meios “mais saudáveis” para a sobrevivência em comunidade. Surge então uma maneira moderna de “desmascarar” as pessoas, talvez apenas uma atualização do método que citei no inicio. A verdadeira índole do homem-de-hoje pode ser percebida não mais pelos momentos em que está errado, mas sim nos momentos onde está –pasmem- coberto de razão.
  Se concordamos que errar é humano, pressuponho que estejamos acostumados a lidar com esse ponto comum e visceral. A evolução, então, reside no estar certo. Acredito realmente que quando uma pessoa está numa discussão e detém a razão, é aí que sabemos quem É ela. Quando estamos certos, frequentemente somos cruéis. Quando temos a faca e o queijo, quando temos o poder e os motivos para arregaçar o outro, quando a situação nos outorga o aval à carnificina, quando o outro não tem escapatória, quando nossos motivos são publicamente legitimados... aí sim estamos a um passo de mostrarmos quem somos. Simplesmente porque é quando optamos pela Justiça ou pela Misericórdia, pela Razão ou pelo Amor, pelo Ensinar ou pela Vingança, pelo Cerrar os Punhos ou pelo Estender a Mão. Quando temos validade popular para condenar o outro, é o melhor momento para sermos julgados.
  Acho que hoje, o que inevitavelmente desmascara o homem é como seu coração age quando ele está certo. 

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