O Eclesiastes e o vô Zéca


  Nunca me interessei por este livro. Sempre me soou como uma sobreposição de sensacionalismos, uma sequencia de pensamentos impulsivos, aleatórios e por vezes –muitas vezes- contraditórios. Semana passada um amigo que admiro muito disse que era o Eclesiastes um de seus livros preferidos. Ok, isso me atrapalhou um pouco. Reli o livro todo. Continuo achando o livro um relato bipolar, um discurso inconstante e indeciso, mas agora dono de uma beleza mundana, e por isso, celeste. O livro é emocionante, agoniante e real. Explico.
  A autoria não é ponto comum entre os estudiosos. Há quem diga que é o rei Salomão, e outros dizem que, baseado no conteúdo das críticas, é bem posterior. Este rei foi considerado pela tradição judaica um vértice de sabedoria, um orgulho de Israel. Logo, assinar como Salomão seria uma eficaz estratégia para garantir a autoridade dos escritos e essa sempre foi uma prática comum na literatura antiga (achei 1 Reis 5:12 que fala dessa sabedoria). De todas as teorias que encontrei em minha pesquisa, a mais coerente retrata o autor como algum sábio, provavelmente de Jerusalém, durante o período em que a Palestina é dominada pelos Ptolomeus do Egito. Desse contexto político, econômico, social e cultural tumultuado nasceu o Eclesiastes.
  Entendendo o cenário, imaginei o desespero REAL vivido por quem escrevia! Agora as críticas e conselhos de coração acelerado e a escrita ansiosa fazem todo sentido! É alguém que vê a injustiça açoitando escravos, vê abuso de poder, exploração política, econômica e mais uma série de mecanismos de morte. Mas isso tudo é extremamente atual! E diante de tamanhos estupros nós também somos inconstantes e controversos!
  Lembrei então do meu vô Zeca, lá de Piracicaba. O Homem mais simples que se pode ser, talvez por isso tão sábio. Me assombrei com a proximidade dos pensamentos de “Salomão” com o vô Zeca! Frases como “Como posso eu trabalhar tanto e deixar tudo a vocês sem certeza nenhuma de que irão cuidar?”, “O que nos resta é deleitar no pão e no vinho”, “Não há nada melhor que praticar o bem enquanto vive”, “O vivo sabe que vai morrer, e o morto, o que sabe?” Eu achei o autor do livro! Pois, foi o meu vô!
  Me apaixonei pela humanidade deste livro! Uma hora o trabalho é o que dignifica, outra hora é nossa "sina". Numa hora o que resta ao homem é gozar os seus frutos, na outra, é melhor entrar numa casa em luto do que numa em festa. As vezes é bom ficar sozinho, as vezes o bom é estar em dupla. No início lemos que a sabedoria torna o homem infeliz, depois ela é uma salvação! Entende a inconstância?! Entende como é real e atual? Sou eu, é você, é o Brasil! É o vô Zeca! Deus do céu, que lindo...
  Hoje sou apaixonado por este livro, pois encontrei nele uma sobreposição de sensacionalismos, uma sequencia de pensamentos impulsivos, aleatórios e por vezes –muitas vezes- contraditórios.

Tetelestai

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3 comentários:

  1. Texto dedicado a Gedeon Freire de Alencar, um cearense metido e cativante.

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  2. Vantagens de quem caminha sem se trancar em conclusões ao ponto de não revê-las...como é bom mudar de idéia, e se permitir mudá-las.

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  3. Teus amados me emocionam
    por meio de tua escrita
    turbilhada de sentimentos.

    Até aqui, não houve alguém que admirasses e escrevestes, em que não tenha eu ficado emocionada.

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