Muito prazer, meu nome é Otário.

 Esta semana um amigo me mostrou uma música chamada “Muito prazer, meu nome é otário”, dos Engenheiros do Hawaii. Esta banda nunca me chamou a atenção, contudo, entrei em choque com tamanha identificação. Não sei se me alegrou ou me entristeceu. Acho que me assustou. Permito-me aqui continuar a letra com devaneios meus.

  Muito prazer, meu nome é otário, um jovem velho. Alguém que ainda tem a mania desnecessária de chegar no horário.

  Eu até tento a vanguarda, mas não me enquadro ao comum da minha geração. Cansei de ver gente fingindo estar bêbado e quando o celular toca, subitamente fica bem e atende com outro tom de voz. Cansei de ter amigos com sequelas causadas por beber e dirigir. Isso não tem nada de acidente. Prazer, me chamam de otário.

  Minhas sinceras desculpas mas, não sei fazer jogos do tipo “você não pode tratar tão bem, a pessoa vai se desinteressar”, não entendo fumantes esporádicos, tão pouco pastores safados e padres pedófilos. Não entendo gente que prega sobre esse tal Cristo e fica dando “migué” na declaração do imposto de renda, na inspeção do Controlar, na conta do iTunes, nas filas e áreas restritas, nos restaurantes ou até mesmo não avisam se algo não foi cobrado na conta, um refrigerante à menos, por exemplo.

  As vezes me vejo como o Lineu da Grande Família, um idoso indignado. Assustadoramente convicto e indignado. Não consigo. Não consigo achar graça em igreja que expulsa gente do grupo, em pai que entra com recurso porque o filho vagabundo repetiu de ano. Mães esbeltas que permitem que os filhos fiquem obesos... Muito prazer, sou conhecido como “o otário da rua”.

  Sou aquele de quem algumas pessoas, após se entreolharem, se afastam pensando “nem fala pra ele, senão ele já vai chiar”. Sou desses que teima em não desacreditar das pessoas. Sou desses que ainda que numa “pindaíba desgraçada”, está sempre dando aulas de graça a quem peça de coração. Sou desses que vende o sax para ajudar o cara que “sonhava” em fazer faculdade, mas depois some com meu dinheiro. Sou desses que encontra o próprio boné perdido, passando na cabeça de um aí.

  A única pessoa que encostou uma tesoura no meu cabelo foi meu avô. Terminei o terceiro colegial tendo faltado apenas quatro dias na vida. Não entendo universitários pseudo-intelectuais que colam em provas. “Comparam resultados” eles dizem... Sou desinteressante e deselegante, como convém a um otário.

  Sou aquele que chamou uma menina para tomar um sorvete e ela riu por achar ultrapassado e esquisito. Afinal, ficar segurando um copo, conversando num lugar escuro às 3am, rodeado de "alegrinhos" e “música” alta é muito mais convidativo do que sentar na guia da rua à tarde. Sou um piegas de 25 anos. Um filme de rolo. Um amante da família ao modelo italiano. Um "retardado" na essência da palavra retardado, atrasado, ultrapassado, desatualizado..

  Muito prazer, meu nome é Otário, um amante das causas perdidas. Caçador de moinhos de vento. Um homem que não troca ver um dente de leite cair, por uma oportunidade de emprego.

  Fique à vontade para não voltar mais. Mas se ficar, fique descalço comigo. Assim, tudo o que é meu será seu.

  

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