Oração do Músico

Deus,
  de todas as  cartas que te mandei, guarde pelo menos esta.

Quando eu não estiver mais, que pelo menos minha música seja lembrada, pois foi tudo o que eu tentei ser.
Seja ouvida em viagens de casais enamorados, em qualquer estrada à dois.
Que seja cantarolada mesmo desafinada e com a letra errada, pelo bêbado que tem no cantar solitário o único atraso da morte.
Que a minha música seja sussurrada pela mãe que nina um bebê sírio, em meio a guerra civil.
Que eu tenha a honra de ser a melodia lembrada por um homem leve, que passeia com seu cachorro num domingo, e recolhe o cocô com uma sacola.
Qua minha música seja aquela tocada no ipod de um corredor no quilometro 41 da maratona, e o acelera emocionado. Porque ele achava que não dava, e deu.

  E sejam as minhas notas menos atrapalhadas que as minhas letras. Palavras ansiosas, que se acumulam sem muito enredo, mas embriagadas de Querer Bem.. E quando se agruparem, formem acordes mais bonitos que minhas palavras. E quando se encadearem, melodias Maiores, que toquem os corações que minhas frases não alcançam.

  E quando meu calar for longo como uma pausa de semibreve, que seja como o silêncio antes do beijo. Jamais um vazio.

Que a minha música seja usada em casamentos, que ainda que durem pouco, foram eternos no momento em que ela tocava.
Que console o fracassado. Alimente o miserável. Seja pelo menos um descanso no meio das perdas de quem só vem apanhando.
Que a minha música seja usada num vídeos de fotos bregas, que por serem bregas, fazem os outros rirem acreditando que aquele dia foi mais engraçado do que ele realmente foi.
Que o Vencedor e o menosprezado Segundo Colocado, tenham todos abrigo debaixo da sombra que eu sonhei que Ela fosse. Mas que tenha lugar cativo aos Últimos Colocados e então seja o som do evangelho de Cristo. Que faça todos dançarem ao mesmo rítimo, unindo os diferentes e trazendo dignidade aos excluídos.

Minha música me denuncia e me esconde. Me aprisiona e me liberta.
Amores, derrotas, sonhos e medos.
Valores, desejos, contos, segredos.
Idas e vinhos, vitórias e voltas.

Recebe de bom grado, Deus. Porque eu toco de coração.


Foto tirada pelo meu aluno Rodrigo Calabrez - Mendoza, Bodega do Salentien

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